EAD e eLearning: reflexões sobre antes e depois do MPeL

    Durante os anos de estudo e nas primeiras práticas profissionais, é comum haver dúvidas e divergências quanto à conceituação de alguns termos, temas, metodologias, conceitos. Tomando a área educacional como exemplo, dada a sua vastidão de referências, temáticas, campos de atuação e conceitos, percebe-se claramente a importância de entender as especificidades - básicas, ao menos - de cada aspecto que concerne às áreas de atuação. São muitas as nuances e muitas as interpretações, dado que a educação ocorre de formas diferentes em tempos e espaços distintos. Bons exemplos são os conceitos de Educação a Distância (EAD) e elearning.

    Por ambos, hoje, aplicarem muito dos seus conceitos com base nas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), é comum nos depararmos com definições simplistas que resumem os dois conceitos à aplicação de ensino (ou distribuição de conteúdo) online. Porém, é preciso ter em mente que nem EAD nem elearning tratam-se apenas disso. Contudo, até antes do início deste Mestrado em Pedagogia do eLearning pela Universidade Aberta de Portugal (UAb), nem todas as definições e conceituações a seguir relacionadas eram tão claras, pois tal reflexão nunca havia sido feita por mim com tal profundidade. 

Sempre tive em mente que a EAD se baseava na ausência de sincronicidade entre tempo e espaço, tanto nas relações professor-aluno quanto aluno-aluno. Sendo, então, essa disposição geográfica dos atores envolvidos muito diversa - ocorrendo inclusive, conforme apontam Moore e Kearsley (1996), citados por Lima e Capitão (2003), nos locais e tempos convenientes ao aluno, tornando-o muito responsável por sua aprendizagem -, esse, até então, era o fator mais significativo para a minha definição de EAD. 

    Entretanto, o fator comunicação passou a ser mais evidente conforme minhas experiências com educação a distância aconteciam. É evidente, assim, que as tecnologias envolvidas não têm (e não devem ter) como objetivo apenas fornecer uma bela interface para transmitir vídeo aulas ou um design bonito e atrativo comercialmente ou um algoritmo extremamente inteligente para traçar os perfis dos estudantes. É claro que todas essas questões também são importantes, porém a comunicação depende muito de como essas tecnologias estarão à disposição para possibilitar uma interação significativa e enriquecedora entre alunos, professores, tutores e demais agentes. Pois, conforme afirma Bento (2017), “a internet é uma condição para a melhoria da oferta dos cursos, porém, a preocupação das instituições de ensino não deve ser com a ampliação dela, mas sim com a qualidade dos cursos e materiais”. Tudo isso é essencial - e está muito bem contemplado no Modelo Pedagógico da UAb, inclusive. 

    Mesmo assim, ainda deparo-me com algumas definições de que existe o uso das “TIC para distribuição de materiais e interação” (Lima e Capitão, 2003). Embora as TIC realmente tenham essa função, o que me chama atenção nessa frase é que, considerando o cenário atual e tantas metodologias que privilegiam a prática, a cultura maker, o aprender fazendo, as TIC podem contribuir não apenas para distribuir materiais mas também para produzi-los. Estudantes estão constantemente produzindo conteúdo e são agentes criadores nesta sociedade em rede na qual vivemos.

    Outra questão que também me chama a atenção em muitos modelos de EAD é a diversidade de profissionais envolvidos - a chamada equipe multidisciplinar. Esse conhecimento passei a ter com mais afinco a partir do contato com outros profissionais e com os conteúdos do Mestrado. É perceptível que o produto final de um curso EAD é composto pelo esforço de professores, tutores, designers, técnicos, administradores, pesquisadores e até do próprio estudante.

    Quanto a essa autonomia do estudante, é notória e cada vez mais perceptível a responsabilidade que recai sobre ele. O simples fato de possuírem estilos de aprendizagem diferentes já diz muito sobre a necessidade da EAD prover recursos e utilizar-se das metodologias e tecnologias para extrair o máximo dessa diversidade de capacidades. Um bom exemplo é a opção por modelos síncronos ou assíncronos, que diferem em seus objetivos e aplicações. Pode-se extrair o que há de melhor em ambos, dependendo do contexto nos quais são aplicados.

    Quanto ao elearning, por algum tempo imaginei que sua relação com a EAD fosse algo como um diagrama de Venn ou que tivesse uma relação de “A está contido em B”. Enganei-me. Percebi que existem muitas discussões acerca da definição correta do termo e que esta é extremamente ampla e, semelhante à EAD, está em constante evolução.

É comum pensar no elearning como “aprendizagem eletrônica” - devido ao prefixo “e”, presente também em e-mail, e-reader, e-token, entre tantos outros. Porém, essa definição é um tanto incompleta, dadas as suas muitas características - muitas delas que passei a me atentar recentemente. Então, o que significa esse “e” de elearning? O que é, de fato, elearning?

    Do ponto de vista da tecnologia, ele está atrelado muito fortemente à internet e ao acesso à informação. O hipertexto e as potencialidades em criação, distribuição e atualização de conteúdos em rede é forte característica neste ponto. A colaboração é possibilitada sim pela internet nesse sentido devido à sua grande diversidade de ferramentas e recursos. Contudo, então, elearning é usar a internet para ensino e aprendizagem? 

    Não. 

    Usar uma tecnologia, por si só, não caracteriza elearning. Do contrário, utilizar um DVD-ROM também o seria - e não é tampouco.

    Então, o elearning é uma extensão da sala de aula?

    Também não. Disponibilizar eletronicamente as mesmas informações (ou mesmo que sejam outras) que são utilizadas em uma sala de aula não caracteriza tudo o que elearning significa. 

    Fazendo questionamentos como esses, percebi que o uso das TIC devem favorecer interação, comunicação, integração entre presencial e a distância,  estratégias de colaboração entre todos os atores envolvidos, a criação, distribuição e manutenção de conteúdos e materiais. Ou seja, é a união da pedagogia com as possibilidades da tecnologia em cada contexto. 

    E o “e” de elearning

    Neste percurso desenvolvido no mestrado, deparei-me com diversos autores e referências apontando possíveis significados para a letra. Tomando como referência a síntese feita por Gomes (2005), na qual reuniu a definição de diversos pesquisadores, construí o diagrama a seguir com 9 (nove) significados para a letra "e" de elearning compilados nessa pesquisa (clique nas setas da imagem para avançar).

    

Diagrama eLearning por Jardel Garcia com base em Gomes (2005)

    Nesta tentativa de buscar um conceito definidor para elearning, mesmo não havendo um único, percebi pelas definições de alguns autores, como Gomes (2005), que muitos associam o “e” a extended, que me parece uma boa palavra - melhor que eletrônico. Masie (1999), citado por Gomes (2005) dá uma definição da qual agora tenho grande apreço: “Elearning é o uso das tecnologias de rede para projetar, entregar, selecionar, administrar e estender o aprendizado”. Dado que “estender” pode significar aumentar, engrandecer, expandir-se no tempo e espaço, parece-me uma ótima definição.

    Dessa forma, concluo esta reflexão apontando que, mesmo não havendo uma definição pragmática para tudo, o que realmente importa é compreendermos todas as nuances de cada conceito pois isso impacta em como iremos lidar com as pessoas, recursos, técnicas, metodologias e situações nos mais diferentes contextos. E essas conclusões através desta exploração são contributos extremamentes valiosos adquiridos neste momento do Mestrado em Pedagogia do eLearning.


Referências:

  • Bento, D. (2017). A produção de material didático para EAD (1st ed.). São Paulo: Cengage Learning. 

  • Gomes, M. (2005). E-learning : reflexões em torno do conceito. In Congresso Internacional sobre Tecnologias da Informação e Comunicação na Educação (pp. 229-236). Braga: Universidade do Minho. Retrieved from http://hdl.handle.net/1822/2896

  • Lima, J., & Capitão, Z. (2003). E-learning E E-conteúdos (1st ed.). Portugal: Centro Atlântico.


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